domingo, 23 de janeiro de 2011

Durante o temporal, meu peito se arromba cismado

Pensou que se ouvesse um Deus ele seria com certeza desocupado. Como ele pode ser tão desonesto a ponto de fazer isso? Deixar que dentre as minhas frestas passasse tanto desarranjo. Das paredes do quarto jorros seminais e aquáticos estirparam meus risos convulsos com Genet. Interrompeu nossos beijos assim sem cerimônia nenhuma. Pra minha tristeza, senti-me num barracão desalmado feito de plásticos e restos de propagandas infames. Meus livros, partes ternas de minha alma morrem e se umedecem em lágrimas, enquanto jorros medonhos os levam pra longe. O quarto quase desabado em água. Dentro de mim uma raiva constante, uma falta de fome, pedaços de sensação desmoranadas como pedaços de gesso do teto no chão. Em meio a água. Pedaços daquela sensação de horror. E até parou de pensar nas coisas mundanas, seus livros boiando chorosos no meio da tempestade e seu teto desabado preenchiam-no de uma raiva e uma tristeza maior que qualquer amante. Esmurrava os armários na impossibilidade do choro. Os demais inquilinos ouviam com revolta os murros surdos. E na impossibilidade de salvar a alma sacou de uma sacola uma garrafa de Domecq e sentada numa cadeira velha com os pés enfiados na charneca improvisada e particular continuo lendo Genet, enquanto esse pingava solidamente sobre seu colo. E de tão amuado e contido nem se incomodou com tudo que lhe enchia a testa de cisma, a Tv alta do vizinho surdo, os latidos do cão vira lata... triste e marginal como seu livro úmido.

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