domingo, 26 de junho de 2011

Para raios intercalado com soníferos

As pessoas são cheias de segredos e silêncios. Engasgos e choramingos. Coisas paradas na mente, como água parada. Criam vermes como nos tecidos deixados para apodrecer num terreno baldio. Pode-se recolher aos baldes as palavras azedas, as frustrações e as incertezas. E não, isso não tem nada a ver comigo. Antes tivesse. Mas fosse só a minha dor, bastava, o mundo tornava-se umbigo de novo e só o meu dedo tremendo em frente ao espelho e meus olhos vermelhos diriam tudo do mundo. Mas não, eu funciono como uma espécie de para raio. E ao meu redor, nessa semana, tem muito olho desmanchado por noites insônes e muita boca inchada de tanto se explicar. Só existe um meio de passar ileso por isso: não vendo. Mas o estado de cegueira é trivial, é o estado dos cachorros no extase do osso. No auge da lambida fria no pedaço de couro morto. Não é mais nada que a sua imaginação criando beleza onde já não existe nem mesmo a poeira ou a lembrança indevida daquela sensação de fome. Por que as vezes nos meus pensamentos tudo se resume a fome. Tudo descamba numa ânsia, mas que nem sempre é sua ou minha, é alheia. E ela rebate e retumba no saco vazio dos nosso estômagos ou nas nossas ásperas saídas de emergência. E numa semana que termina com tantos alardes alheios, e tantos recolhimentos, salivas e cuspes, resta apenas esperar que o próximo raio caia sobre meu peito e o abra como uma mexerica caldalosa e que pelo menos no meu caldo menos expesso alguma coisa possa projetar um sorriso em quem quer que seja.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Comum

Movediço. Ouvindo músicas ruins, que colam à parte mais intíma dos tímpanos. Numa tentativa frívola de me sentir mais perto do comum. Daquele instante comum. Mas está descolado. Meu peito, dedos, verbos, cabelos, pêlos estão descolados. Embora sinta saudades. Parece-me cada vez mais insuportável ficar entre as pessoas. Entre certas pessoas. Trabalhar com pessoas. Sinto tão melhor, tanto alívio em meio as folhas de papel, a tinta e aos respingos de cor na camisa. Assim entre desenhos, pequenos rabiscos, no mundo das idéias. Alguém uma hora escreveu " eu não vivo de sonhos, mas de realizações". Eu acho que vivo de pensamentos desconexos. De linhas extravagantes e de mobilias cor tabaco.


Ai de repente muda tudo e num lugar desmontável aquele homem fica desmontando nuvens e perdendo as horas conpensando os seus sentimentos em formatos inflavéis. Ali, sem sequer parar para olhar o relógio, mas de olhos fixos no sol. As retinas queimadas. A letargia esparramada pelas camisas, telhas, cremes, passarelas, caminhadas. Entre aquelas expressões facéis e aquelas que parecem facéis mas que são cheias de alguma coisa que bóia e chega até alguém como algo novo, mas que aqui é velho velho, mofado mesmo. Com cheiro de folha seca. Fica assim sentindo esquemas aritméticos dentro do coração. Esbanjando alienações. Inibições. Exibições. Espera. Espera? Espera!!


Eu não terminei!! Hey, espera!!


Foi? Você ouviu? Eu chamei! Claro que chamei!


Isso não faz nenhum sentido


Não?


NÂO


É que vocÊ tá ocupado demais ardendo por ai dentro de garrafas e não percebe onde os pontos se conectam e onde os personagens são exatamente o reflexo mambembe de um desejo qualquer que até já se esqueceu de nascer.


Papapa pa ra ra, sabe?


Hein?


A música!


Você sabe, conhece essa música! Você que me ensinou, agora fica esse papapapaaaaaa aqui quando eu fico sem saber pra onde olhar, quando as nuvens não se deixam engarrafar e os desejos não desejam sair do ventre da minha saliva.


Ah eu fico sonhando em dormir na geladeira. Ao lado das garrafas de vodka. Ao lado dos iogurtes e alfaces. Mas e se não tiver nada na geladeira? E se meu dinheiro tiver acabado antes do décimo dia útil e não houver nada na geladeira? Resta a solidão do frio. A existência do silêncio e todas essas coisas que me são tão comuns. Olha ae, eu sou comum.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

De como o tempo pode ser monocromático ou como hoje alguma coisa foi dispensável

Não estava aqui, agora esta. Essa sensação de estar só no mundo, vasto mundo. De respirar clichês, pela ausência de expressões. Tendo ainda assim, um dicionário gigantesco ao lado da cama. Sinto que faço as coisas somente pra mim. E isso me dá uma solidão danada. Alô? Paredes. E ae? Beleza? Discurso fake, conversa mole, quebrada sabe? sabe? Ah, nem tem ninguém aí. Eu acho que perdi algo no meio dos nós. E eu sigo procurando. Mas fica cada vez mais distante ou eu que penso demais. E desespero demais. E urino demais. Bebo pouco nos últimos dias. Fico no impasse da espera e nada alivia. Telefone. Email. Mensagem. Toda essa espera. Todo esse desconforto de ter um calendário pregado na cara. De ter que entregar meio mundo no espaço de 35 dias. E ainda assim, ter que ouvir que é tempo demais, que tem tempo de sobra. Acho que sou larga então, me esparramo demais. E fica difícil voltar a minha forma original. E ainda assim, ainda tem tempo pra me sentir só. No meio dos livros. Sinto saudades de mim quando pessoas, mobilias, calendários, relógios, cachorros, chinelos, meias, camisas, pastas, figuras não passavam de cogumelos estampados e amarelos no meio do jardim.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Blocos deslocados na sala de TV

Tem algo que parece com esse vento. Com esse frio. É repetitivo. Uma ânsia que vem e volta, feito maré dentro dos dentes. Submersa na ponta dos dedos. E de repente irrompe em sonhos, pensamentos. Fica um azedume, aquele gosto de sangue pisado na boca, sabe? Quando um dente sangra e fica aquele gosto estranho. Mas que é tão sensível e tão bom. Eu fico assim, pensando em dizer coisas que não devem ter muito sentido. Hoje eu vi um recado de um alguém para um outro alguém, vamos chamar de Botão para o casa de botão e fiquei feliz que eles se achassem tão perfeitamente entrincheirados um no outro, quase indissociavéis. Imutáveis no seu amor andarilho. Porque em tanto tempo de inquietude, em mim descansam as palpitações. É uma sensação vazia, porque eu acho que sou feito de amor. Eu fico doendo. Mas agora eu só fico aqui entre montes e montes de papel. Tem muito trabalho com o qual me ocupar e pouco coração pra lançar no espaço. Ficam fiozinhos ainda translúcidos daquelas coisas passadas que de vez em quando passam pela minha boca, mas eu tiro com um meneio de mão muito delicado.


Mas o meu alfabeto às vezes degela: daí eu escrevo um poema, quer dizer, eu rabisco qualquer coisa, porque um poema é algo muito frágil pras minhas mãos e ao mesmo tempo muito pesado pro meu abraço.