sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Ela


Ela tinha algo que movia. Algo que fazia o mundo girar dentro do baixo mundo. Tinha algo que seduzia. A droga perfeita segundo Trent Reznor. Algo no seu silêncio cheio de pequenos pontos aderentes. Algo na sua sensualidade latente que fazia do rastejo quase um regozijo. Ela tinha o dominio do veneno, da boca. Das ruas, dos pontos de venda, ela sabia que quando o vício chegava no auge, todo o resto de desfiava em edemas. Ela era mortal a medida que sussurrava.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Se

Se houver um minuto de silêncio no meio da chuva e dos trovões você saberia dizer o que a boca de alguém saliva? Quais palavras estariam intensas? O que seria um grito? O que seria um choro ou apenas chuva? Se houvesse um gemido no meio da multidão saberia o indício de prazer ou sofrimento? O que seria desse momento? Eu ainda nao enxergo por trás das intenções, eu não tenho mais que duas mãos para segurar um corpo frágil que se despedaça num sopro. Eu não tenho tempo para compor todos os poemas, os dilemas e histórias que gostaria. Se houvesse um dia de chuva a mais dentro da minha cabeça, seria como uma inchente levando gavetas vazias, pedidos solenes e sensações de distância. Porque quando eu vejo um bom dia longinquo eu sei que a conversa não vai durar.

sábado, 21 de novembro de 2009

Duas coisas a mais no mundo

Deitou a cabeça num horror. Ainda havia algo de patético naquela espera. Naquele algo mais que a vida não entrega de mão beijada. E tudo no fim parecia um livro ordinário de auto ajuda. Abriu uma garrafa d'agua e ficou ali na beira da sua cama no seu micro apartamento. A chuva caia imperiosa e ele ainda aguardava seus salvadores quinze minutos de sucesso. Mas a onda de histórias equivocadas se aglomeravam na palma da sua mesa. E na quina das suas cadeiras ficavam os jornais e as revistas onde ele incessantemente procurava a referência do seu nome.

sábado, 14 de novembro de 2009

Crônicas de uma mente vazia Vol.4

Cansei de comer putas, arrombar corações e ter o meu estilhaçado a cada perda. A cada concerto grosso de gemidos ocos a boca fica anêmica e uma ferida imensa surge no que seriam minhas palmas. Tocar apenas a superfície vítrea dos seres. Ter apenas um prazer doentio em retirar as certezas em gotas de suor. Apenas o mais baixo da alma. A menor unidade de tempo nos braços de alguém. A ferida mais fácil de cicatrizar que em mim fica coçando e sangrando por dias. Cansei de esticar noites em bares asquerosos com copos preenchidos de vazio. De conversas rasteiras que não me detém. Cansei de esparramar palavras doces e súplicas por uma aprovação da minha existência. Um RG maldito gritando minhas qualificações como ser humano. Cansei de dar murros em ponta de faca e passar o dia com a mão retalhada. De ter percepção dos rodeios, das mentiras e das pequenas ações esquivas, do pânico que meu gênio causa. Já estourei o saco pensando em como mudar o mundo, mas hoje nesse dia cinza, a minha criatividade mórbida tornou-se moribunda e aquela revolta que sempre me sobe aos lábios viu uma chance de ver o céu. A goela fica ardida e um sono povoado de imagens doentias quase lisérgicas recobra calor as minhas gengivas. Cansei de certa forma dessa vida cheia de crônicas vazias sobre pessoas estranhas e suas deduções.

Abro a geladeira na busca de uma cerveja, alguns vícios são difíceis de rejeitar na solidão da casa, o degelo não me traz os mesmos pensamentos de Eisenstein, apenas uma umidade que acaba em poças largas, ou que pelos formará poças largas pela manhã. Deixo o liquido gelado lamber minhas caries e me provocar dores finas e sedentas. Jogo o copo ao fim contra a parede pelo simples prazer de depredar meu universo fantasioso.
Crônicas de uma mente vazia Vol.3

A boca soltou chispas. Na direção errada. Soltou mágoas em silêncio por SMS oculta. Ficou ainda vendo se o celular seria atendido se uma resposta seria escrita. Que nada. Moveu-se lenta de volta ao afazer daquele instante. Nenhuma ruga, vinco, passo, tremor, não sei se ela chegaria até o final do dia sem saber. É...chegaria. Chegou. Abriu a porta de casa e desceu uma escada lisa em direção ao chuveiro, como um prédio lavado deixou escorrer todas as perturbações. Do outro lado da cidade alguém se acomodava em um sofá azul demais para uma sala clássica e básica. Alguém que pensou fazer a maior merda de sua vida. E não, não era se matar. Era se meter num ridículo caso de amor, ou melhor de desejo de uma parte só. Maior roubada nem na tela do cinema. Mas pensou. Por dois minutos pensou. Escreveu dentro de sua cabeça todo um plano sensual que logo viu ser uma merda. Os dedos então soltaram qualquer forma de conexão com o mundo exterior. Ficou imerso numa solidão digna de catacumba. Não havia quem o procurasse. O silêncio das suas relações era quase tangível se não fosse a sua insistência em gritar “estou vivo porra!”. Se não fosse isso, o dariam por cadáver pútrido e já devidamente expurgado do corpo de algum animal selvagem. Mas ele morava na cidade, no coração cinza da cidade e o único animal que poderia devorá-lo era um mosquito ou num caso raro de animal perdido do zoológico. Como aquelas antas que aparecem na beira do Tietê. O que pode ser considerado bastante selvagem para um lugar em que mal habitam as flores. Mas enfim, saltou dentro de si alguma coisa que era muito parecida com um gemido, não prazeroso, não assustador, não choramingado, uma cólera. Um copo de cólera que se quebrou dentro da sua boca faminta. Queria mesmo era atear fogo a todas as suas paixões (físicas, mentais, manuais) e vê-las na pureza cinza de um granulado. Queria se purificar. Mas isso soa tão católico e tão culpado. Como se houvesse um pecado, o oitavo pecado capital: a idiotice. Se houvesse esse pecado e se houvesse o inferno, não restaria alma e o inferno teria problemas com CDHU, taxa de desemprego e taxa de natalidade. Mas era mais ou menos isso que queria. Queria se soltar. Estava triplamente cansado de ver o fim do mundo a cada cinco minutos por causa dessa ou daquela pessoa. Era exagerado, sabia bem disso. Era afobado, sabia bem disso. Sabia bem de várias coisas. Mas isso não adiantava muita coisa. A boca soltou frias chapas de palavras. Paredões de incentivo ao niilismo. Na direção errada. Na versão avessa do tempo ficou sonhando com coisas e pessoas que estavam muito longe de existir.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Crônicas de uma mente vazia Vol. 2

Que diferença faz se não há uma história para contar? Se não há um roteiro e cenas bem dispostas, há apenas fragmentos flutuantes num oceano de aparências. Que diferença faz se você não fecha a porta? Se eu não pulo da janela? Essa palavra ou aquela? A tarde está escaldante e ainda não há nada que preencha de vontade o copo a minha frente. Este último copo trazia tantas expectativas. Trazia tanto desde a sua chegada, mas vejo-o vazio, sem nenhuma mistura que possa medicar. A tarde está quente e o terreno asfaltado parece se retorcer, a espinha da cidade procura refúgio, como dedos mornos numa parede fria. Afastar de si o calor e as expectativas. Que diferença faz se a semana exigiu algo que não recebeu? que diferença faz se o mundo se tornou mínimo e ninguém percebeu? Percevejos sobem nos crânios vazios e nos fêmures detonados pela poeira e pelo descaso, que no fim das contas somam o mesmo item. Rebuscado trabalho de palavras na tentativa de esconder o rosto do sol e da feiúra que naquele habita de forma tão intransigente. Pela sujeira que nele se aglutina formando novos vincos e saliências. Eu não respeito a nova gramática do português. Ainda uso acentos. Ainda preservo a beleza das palavras e luto contra a sua massificação. Guardo na geladeira um pedaço do meu coração, keep cool boy.
As horas pesam, passam incomensuravelmente lerdas, belas e prensadas. Como um dog. A cabeça minha fica entre o purê de batata (abusada de pensamentos ilícitos de amores vítreos de terrores vulcânicos de desejos insanos e de vodkas impuras) e a mostarda. Minha sensação de morte e dor de coluna não poderia ser mais crível. A novela não menos expansiva. Necrose nas pernas, não há para onde correr. Porque a luz do sol cospe sobre tudo sua potência e não há mais cantos escuros nem morcegos nem lentes de aumento. Não há mais cervejas nem desculpas nem sortes. Não há muita coisa que se possa explorar além das alvas folhas de papel que se traduzem em novas solidões. E por mais risonha que fique minha cara pregada numa foto anual quem me absorve cospe de volta o gosto amargo de um fruto acre, roxo morto. Me sinto estupidamente encarcerada. E sinto que ainda haveria beleza se não fosse o pessimismo, e a burrice crônica que toma conta das minhas partes, por descaso, por desuso. Um lado do meu cérebro faleceu de solidão a semana passada. E toda uma parte do meu coração foi esmagada na via Dutra entre fotogramas e largas passadas. Não há mais nenhum pássaro solto no céu. Não há mais nenhuma cor além do azul saarico. Da oferta a preços populares de uma dor que eu já me afeiçoei. Não dá pra entender como tudo isso aconteceu. Aquele copo me trazia tantas esperanças. Aquele copo tinha tudo pra dar certo. Pra ser cheio. Mas ficou trincando num canto que corta a boca e não dá pra remendar. Apensar de tão estar quebrado, ficará inutilizado numa vitrine esverdeada desse bar louco. Que diferença faz pra ele a frincha ou o racho? Acho que nenhuma sorte me convém nesses dias. E ainda assim me fecho mais num cubo duro e escuro de inquietações que futuramente você poderá ver num folheto qualquer ou numa esquina a tecer histórias que nunca foram solidas fora das linhas que o prensaram.
Crônicas de uma mente vazia. Vol. 1

Entre dizer e não dizer apenas o masoquismo do silêncio, das relações frustradas. Das inquietações e das parcerias e confianças exterminadas. Finda aqui no rosto sério o que há de realmente sério e humano. Conte tanto com meus dentes quando com as estrelas do mar. Finco os pés numa terra grossa e escura, preencho a boca com ela, provoco terremotos no silêncio e por vezes quero gorfar palavras, mas de que adiantaria? Apenas um amarfanhado a mais de seres distantes se distanciando mais no cair da noite. O medo da perda pelas escolhas. Ou medo das escolhas sem prever pessoas? A equação sentimental é confusa. Fica entre as respostas coladas no fim do livro e as livres deduções. Uma colagem que não se finda numa colcha de possibilidades inúmeras. E o sol arde. Entre queimar e acariciar ficou restrito na função de algoz de um e dominador de outros. Mas eu permaneço na corda bamba das palavras. Qual seria a boa razão pra me expressar? Só por dizer? Só pra ilustrar ou esclarecer? Que falta de senso. Tento me convencer que é inútil, mas muitas vezes minha língua é mais rápida que meu pensamento. É vejo uma série de teias se romper, arrombadas por insensíveis dedos e prematuras sensações. E teias são muito delicadas, não se reconstituem, nunca voltam a ser as mesmas.

Esse silêncio prematuro as vezes me dá náuseas. As vezes se torna um assassinato premeditado com requintes de crueldade e por vezes é um riso juvenil e estúpido.

E as vezes fica amargo, noutras perigoso, armando ciladas para mocinhas desavisadas, mas a única mocinha desavisada por aqui sou eu.

Entre dizer e não dizer fica todo um romantismo barato, feito de livros nunca lidos, trechos de peças teatrais perdidas na memória. Fica um pouco de tudo isso. O anonimato dos pensamentos realmente belos.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Apesar da dor que a chuva traz entre suas costelas

Apesar de toda a inconstância, todo o apego as marcas do passado ficam vermelhas e ardentes nas noites de frio. Que apesar do calor que o álcool traz o coração permanece frio, sem vontade de bater, preguiçoso esperando a hora de morrer. Que as letras caem dos lábios para os fossos dos dedos esperando o esquecimento como prêmio. Que apenas nesse momento, assim triste, carcomida fico viva. Que preciso da dor pra me mover, me arrastar entre escombros, que apesar disso me matar, necessito. Ainda assim odeio. Ainda assim transformo esse volume de tristeza em algo atrativo pro meu olfato, farejo mesmo a minha desgraça e a noite me adensa. A noite me detém sem sono. A noite me detém fria e pétrea.

A dor passou um pouco. Limpo uma gota de catarro na gola da camisa. Abro uma cerveja pra deixar o corpo mole. A noite entra na minha retina e me sinto invadida. Qualquer coisa é melhor do que ter memória. Do que ter um corpo e uma vontade. Qualquer coisa mesmo. Um pico. Uma estrada desgovernada. Um coma. Um engradado de cerveja quente. Qualquer coisa é melhor do que sacudir as gavetas. Até mesmo fingir que está tudo bem. Que apenas o uso abusivo de álcool me deixa melancólica e triste.