sábado, 31 de julho de 2010

Folha solta sobre o assoalho

Sentiu saudade da saliva. Grossa. Atordoante. Atordoada. Que entra pelos buracos errados. Saliva intensa como tempestade. Fosso cheio de insanidades. Pensou no roçar da pele macia e morena. No amarelo do sol no corpo dela. Como uma dose cavalar de conhaque. Era suave. Entrava descrente no seu corpo. Penetrava avulsa nos pensamentos. Era uma mulher de dentes. Dotada de sutis palavras. Sentiu o peso do peito pulsando delicado nas suas mãos. A boca tensa, sem certeza se era aquilo ou algum outro erro. Se era desejo simples e nu. Era doce. Seu pêlo era doce. De linhas fartas de sentido. Era um bom sonho. Um bom gole.
Tomou mais um gole e tocou um acorde no violão antes que sua alma acordasse pro frio da janela e da manhã assentada sobre os vidros. Mas era daquele frio que se instalava doce. Não era maldoso. Mas sentiu necessidade dela. Como do seu conhaque. Do seu violão. Da manhã de domingo pra descansar o sentido....

quinta-feira, 29 de julho de 2010

cigarro solto nº56

Ficou uma névoa diante dos seus olhos. Dentro deles. Uma mancha rosada dentro das retinas. Sentiu o calor do abraço. Amarelo. Quente. Adormeceu com um pedaço de sonho entre os braços, enrolado nas cobertas, aquecendo.
Pensou em alguma forma de alívio. No abraço. No calor. Mas a solidão dela parecia mais densa que o teor do seu copo. Parecia que o corpo era pequeno pra tanto assombro.
Ficou atado à um fio de névoa....

quarta-feira, 21 de julho de 2010

....

A decepção é um sentimento avesso. Fica entalado na goela.
É coisa estúpida, tão inóspita quando a espera.
Fico matutando na noite febril se é só isso que me aguarda,
tudo que me cabe nessa vida.

domingo, 18 de julho de 2010

Pequeno contraponto

Essa reserva. Eu não entendo a razão. Quero estar perto. Quero mergulhar na onda. Mas me ausento. Me perco na armadilha das palavras. Como se houvesse um medo, uma chance de queimadura no ato da entrega. Tenho medo de você. Mas tenho uma paixão pela sua simbologia, presença, ausência, tempestade, copo e sorriso. Não entendo isso. É a primeira vez que me sinto menor. Retraída. Com vergonha da ignorância que parece exalar de mim. Comparada ao seu silêncio minha verborragia parece inútil. A minha intensidade parece teatral.
Em contraponto, escorro deliciosamente nas suas melodias, descobrindo letras, linhas, pontos, novas possibilidades que só existem no seu mundo.

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Um pensamento acerca do sentir

Se um homem não é capaz de chorar, sentir, sofrer por um grande amor, ele não é digno do seu coração. É pedra travestida de gente. E até pedras amam a brisa. Então o que é um homem que não sofre por amor? Um moderno? Um duro? Um bruto? Não sei dizer. Só sei que sinto, sofro, me alegro com pequenas coisas desses romances cotidianos. E sinto a onda que singra meu peito com força abrindo fendas sem sangue, e às vezes sangrantes. Eu tenho amor que transborda pela ponta dos dedos, aquilo que sinto não se contém num instante, transpassa o cansaço. Mas não é por alguém em especial. Ou pode ser. É um sentimento constante que quer escapulir. Mas que faz volume, faz dor, faz riso. Me faz besta.
Mas, eu ainda não sei o que são essas pessoas que disso nada sabem. Se são pedras que andam. Se são feitas de gaze. Se são espaços imaginados. Essas pessoas que não sabem o que é o amor e renegam esse prazer e essa dor nas esquinas dos seus passados.
Acordei sentindo um pulsar. Um pensamento sobre o amor.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Ida sem volta

Quando tem dores
me dobra num arco
me faz atadura
com pressa
de alma doce
e mãos duras.
Quando tem ânsia
me faz de lenço
estanco a verborragia
numa contenção de contextos.
Mas quando nada há
que assuste
afunde
apenas o eco solitário
penetra o vazio
da sua passagem.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Nº34

Uma raiva nada literária, uma sensação desmembrada, queria explodir deveras as palavras, as paredes, todas as expectativas. Essa sensação descabida não vaza, não tem honra, não tem compreensão que o tempo corre enlouquecido. E que não há mais nada que deixe espaço pro respiro. E essa droga não passa. Não passa. Queria ascender o pavio da alma e jogar ao mar todas as gavetas. Esquecer que há necessidades fora de mim. Em mim. Pra mim. Para outros.
Queria desabar num conhaque, numa morfina, num profundo esquecimento da existência. A vulgaridade das minhas palavras só deixa transparente a brutalidade das minhas emoções.
Cadeiras. Armários. Folhas. Pranchetas. Copos. Pela janela afora.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Para um amor maior ou quando um alguém não levado à sério estremece os músculos


Não sou santa. Nem canalha. Nem adjetivo nenhum que me queiram dar. Sou aquilo que o tempo lapida ou enferruja. A encruzilhada das minhas emoções. Poderia ser um milhão de outras coisas distintas. Poderia ser tantas coisas que não sei descrever. Mas não, eu não sou o que você vê. Não essa superfície barata. Quem sabe eu fosse um falcão,mas por hora escolhi galinha d’angola. Um poema, mas prefiro um Bonassi. O amor de alguma vida, mas por hora prefiro martelar com fogo as veias do meu peito. Poderia ser de muitas pessoas, mas não tenho pressa de ser de ninguém. Além de você. Porque você é feita de tantas outras coisas e poderia e é tantas outras coisas, que eu perco a conta.

Não sou perfeita. Nem feita de folhas. Tem carne, tem veia, tem seio e tem pus. Tem lágrima.Recheio. Açúcar. Conhaque e rum. Tem barbárie. Mas tem paciência. Dentro de mim, dessa cumbuca tem muita mistura. Posso ser quase tudo que existe se eu tiver vontade. Se. E você intensifica essa vontade.

Tem momentos de euforia. Quase boba. quase tensa. Escondo segredos entre as penas. Mas não quero voar com tanto peso entre as costelas. Nem com tanto prazer na cabeça. Tenho uma boca só, mas muitas pernas. Posso correr o tempo necessário pra me perder. Pra esquecer. Mas eu não quero. O que tem de bom na sua mistura, me converte em novas manhãs de sábado. O que tem de bom na sua mistura me lambuza na distância de um bom dia. Tem momento de raiva. E também de letargia. Quando aquele vazio precede a dúvida. O frio do nascimento da vida. A morte que se abate sobre os relógios. Tem lirismo do mestre Dos Anjos. Tem dor de Trakl. Tem prazer de Clarice. As vezes o egoísmo de Schielle. Mas sempre a tensão e o tesão de Neruda. Quando a corda vibra, com a nota certa, com a mão ajeitada eu canto.

O que há em mim é incondicional. É víscera sangrando. Mas por trás do meu riso impossível ver meu pranto. Palhaça de carteirinha. Brinco de malabares com minhas palavras bambas. Aquilo que sai da boca é sempre impulso. O que sai das mãos é vivo, quase puro. O que eu quero de você é mais que o gozo. Que a saliva. Quero ser um pilarzinho da sua alegria. Incondicional. Daquele sentimento avesso a razão que prefere ficar guardado delicado ou ser dosado homeopaticamente todos os dias durante todo o ato da espera, até o limbo do esquecimento plantar outra quimera ou a última morrer de solidão.