sábado, 27 de junho de 2009

Se eu sumir um tempo, é pra não criar dúvidas no riso. Tudo cisma em ocorrer na mesma hora e eu sou péssima pra me decidir. Em cima do muro não é agradável. Ainda feliz por um retorno. Ainda rindo por dentro. Mas sem o vício da espera.O passado pertence ao passado. E o presente é confuso demais. O meu sentimental se enovela todo, veias, carne, saliva, mas a pistola não dispara, aqui dentro nada se move. Por um dia achei que o vazio tivesse se retirado, mas percebo que ele está incorporado a mim. Não tem muito jeito, não dá pra esperar que a Lua saia de seu lugar, que as estrelas parem de rodopiar ou que simplesmente pare de ventar. Cada coisa tem seu tempo. O meu é bagunçado. Por mais que eu queira, não adianta, o tempo escorre lento e espesso.
O caminho até a Lua ainda é longo, reecontrei o Drummond amassado no fundo do meu bolso. E lá vamos nós de novo, em silêncio, pela noite que não tem fim, sem nada ou ninguém.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Quando o inverno ficou temporariamente trancado no banheiro

Passei dois anos contando todos os minutos desde que o seu último passo saiu do palco. O último aplauso num eco desvairado. Perdi o programa da nossa peça e não vi que horas ela começa. Não sei a música que era trilha, mas improviso com uma ou duas até achar o ritmo. Passei dois anos minutando todos os relógios de todos os espaços. Cansei os dedos, cansei as linhas. Deixei os ponteiros brancos e rasos de tanto tentar pará-los ou por vezes apressá-los. E de nada adiantou toda essa comicidade. O tempo continuo escorrendo no seu próprio ritmo, dançando conforme a ordem do playlist. Eu e você ficamos com nossos pares executando os passos soltos. Mas meu pensamento sempre esteve na pontinha da sua janela, querendo espiar. Mas ah, essas coisas são assim mesmo. Pessoas são marés sem lua, vem e vão na hora que lhes convém. E disso já não tenho tanta raiva. Eu só não me acostumei a largar coisas e pessoas, fase polimórfica ainda gemendo. Talvez. Quem sabe? Mas o importante é que quando eu deitei sobre o sol e fiquei olhando as marés de longe, quando me cansei de todas as burocracias do meu coração, quando gastei a esmo as balas da minha pistola em pássaros de plástico o tempo veio e me trouxe uma surpresa. E não era o que eu esperava. Por que o que a gente espera é sempre mesquinho e pequeno. Ou grande demais pra caber numa sacola de mercado. Ele soprou a sua retina pra perto da minha. E olha que coisa, não houve fogos, não houve revoada de pássaros e nenhuma orquestra gigante tocou nossa música tema. Mas como se não houvesse passado um único dia, a gente revirou o riso do avesso. E uma coisa que eu já não tinha tanta certeza brilhou em neon na minha cabeça, que não há quase nada que nos separe. Não é amor, paixão, ódio, nenhum desses extremos. É a mais clássica das respostas: um traço de amizade que não apaga. Fico eufórica porque já nem sonhava mais com esse dia. Os dois anos se enovelam e permanecem adormecidos numa gaveta qualquer, o antes não me importa nem um pouco. E se você de alguma forma voltou talvez K. um dia o faça. Mas cada coisa tem seu tempo. Fico revirando as marés com as retinas, ainda no descanso das emoções.

Por hora, não desfaço o riso, seja muito bem vinda de volta ao meu coração.
Je précise respirer

Me deixem respirar, ás vezes me sufoco com excesso e noutras com falta de ar. Me deixem passar, é um apelo mais que desesperado. Eu quero fundir as paredes ao meu corpo, fazer muralha pela qual ninguém possa transpassar. Barreiras intransponíveis pelas quais ninguém possa me tocar, me ouvir, me chamar. Não tenho talentos nem forças para o apego que querem de mim, para ser o que esperam de mim. As minhas coisas tem seu próprio tempo. Todas as minhas coisas tem seus próprios tormentos provindos do meu interior bagunçado. Elas respiram as minhas palavras. As minhas amarras e não podem mais se defender. Me deixem cair assim em silêncio. Ficar na altura dos meus pensamentos. Que dormem muito profundamente. Deixo uma fita com todas as minhas canções gravadas. Com todas as minhas reações pré-programadas. É tudo que posso oferecer. Meus personagens vivem sem realidade. Sem profundidade. Sempre tocando a superfície de um espelho, mas sem nunca traspassar, sangrar, morrer. Eles vivem no meu mundo insípido. No meu laboratório de sensações esquivas. Não me deturpem. Nem me queixem. Excesso e ausência me preenchem de tempos em tempos. Marés de silêncio com raras palavras presas na areia. Tem sido tão frouxa as aproximações do meu espelho. Por alguns instantes algo me surpreende, mas logo caí no baú das recordações. Sem aviso. Sem peso. Sem tempo de tornar-se algo.

terça-feira, 16 de junho de 2009

Entre a revolta o romance e o rosnado.


Duas portas. Quatro lados. Dois peitos. Uma braço. Três palavras. Dois escarros. Dois motivos. Um acaso. Duas tristezas. Um recado. Três pessoas. Duas avenidas. Quatro horas. Uma espera. Um rosto. Dois silêncios. Três palavras. Um movimento. Dois intensos. Um metade. Um que corre. Dois que partem. Um que escreve. Cinco que lêem. Dois respondem. Um amua. Dois não querem mais saber. Duas ligações. Uma voz. Um silêncio. Nenhuma resposta. Dois que perguntam no fundo. Dois que perguntam de lado. Um que responde baixinho. Ninguém ouve. Um que esmurra. Dois que gritam. Um que chora. Dois que bebem. Uma porta. Dois trincos. Um coração. Seis polígonos. Uma rua. Cinco possibilidades. Um esquiva. Outro bate. Dois sorriem. Outro alarde. Uma porta. Dois sorrisos. Duas bocas. Um sentido. Três minutos. Um desfecho. Um que brinca. Outro que rasga. Um que espirra. Outro que morde. Um se fecha. Outro se envolve. Um se ferra. Outro cospe. Dois martírios. Um Martini. Uma alergia. Dois cuidados. Uma ligação. Quatro copos quebrados. Uma música. Duas recordações. Uma tentativa. Três frustrações. Um silêncio noturno. Duas doses de Contini. Um desespera. Outro flui intenso. Um que range. Outro que parte. Dois que brigam. Um discute. Outro serrote. Um acorda morto. Outro tem um dia de sorte. Duas portas. Quatro lados. Dois peitos. Um abraço. Meia dúzia de palavras. Um noticiário. Um motivo. Fim de caso.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Das rotinas circulares

Cada dia é sempre o mesmo. As pessoas mudam de lugar. Movem-se os pretextos. Mas o contexto é sempre o mesmo. Mudam-se as palavras. Modificam-se os enredos. Mas o resultado é sempre o mesmo. Momentos de euforia auxiliados pelo desespero. Quando houve uma onda jogou-se sobre ela um rochedo. Despedaçado por qual força? Não interessa. O impessoal das perguntas se repete nas respostas. Porque é sempre o mesmo. O mesmo dedo que escreve, o mesmo olho que decifra. A mesma boca que alimenta o mesmo momento descartável e bonito. Poderia ser um dia de frio, uma redoma, uma estufa. Poderia ser o contrário. Ser uma recusa. Poderia ser uma pistola. Mas no fim das contas, da soma, da divisão ou de qualquer outra operação o resultado é sempre o mesmo. Mudaram seu nome, mudaram meu texto. Mudaram meu rosto, deram novo cimento. Mas no fundo, lá no fundo das intenções era sempre a exata cópia daquele sonho.

É daquele sonho que nunca dá pra lembrar. Daquela memória corroída pelo excesso de uso. Por aquela outra coisa qualquer. Mas fatos são fatos. Repetição. Repetição. Repetição. Se você olhar para trás e eu por acaso não estiver mais lá,sinto muito. Porque é sempre a mesma rotina de desinteresse. Pra cada dois passos rodados no salão, quatro pisadas de pé e uma parada para mergulhar num outro mundo que eu não quero estar. Queria o impessoal, mas a garganta dói e sangra. E não, não é dor pela perda, pelo excesso, é pelo cansaço.

Cachorro cansa uma hora de correr atrás do próprio rabo. Cachorro cansa de brincar atrás dos automóveis. Rastro de luz amarela no meio da avenida. Cachorro também morre atropelado. E cachorro cansa. Envelhece. Perde a graça e vira sabão.

Gente também cansa. Perde a graça e vira árvore. Vira galho. Chaleira. Empecilho. Madeira. Cimento. Asfalto. Pistola enferrujada. Palavras que não servem. Gente também cansa, mas não morre. Enverga. Gente também cansa. E se morre, permeia. Vira palavra ecoando no túnel da memória, criando história. Coisa quando quebra, se ferra a gente esquece. E é sempre assim. Na cansada rotina das coisas que são sempre as mesmas. Que se invertem em obstáculos, em maravilhas, em coisas mortas, em coisas frias, em coisas fáceis. Em rotinas.

Cada dia é sempre o mesmo. Conto árabe que se acaba na própria boca.

sábado, 6 de junho de 2009

Por alguns segundos exumando corpos

Ah, eu xingo, deixo a mente vadiar,monto funerais pra minha memória, mas no fundo é tudo história. É modelo de carta em editor de texto. Padrão de tristeza pra comover passante desavisado. Sempre a linha contada com resquícios de dor, palavras apropriadas no gosto grosso da saliva. Mas que na verdade nada querem dizer, além de olhem pra nós! Monto o personagem de acordo com a marca, a gíria, a estampa. Com a marca de nascença, de etiqueta e de espírito. Espírito de porco mesmo na arte de me mentir.
Ponho pistas pros olhos inchados, envergo lágrimas quando não há rosto. Acostumei-me ao espetáculo frio e tosco do vitimismo. Ponham facas e pregos que eu ponho o riso. É bem nesse naipe a conversa. Mas e sempre mas, eu xingo, pra não perder o realismo da cena. Mas que pena. Ninguém viu essa linda atuação. Então pau no cú de todo mundo meu irmão. O palco ali encerado, cadeiras estofadas e confortáveis e nenhum único aplauso? Que tipo de platéia não sádica é essa? Que não curte um sangue falso correndo pelo chão e nem um pouco de vinagre no olho? Tanto esforço pra elevar minha tristeza ao nível máximo e nenhum único " Bravo"?
Eu me minto tão bem que esqueci como eu era, deixei de ter rostos, pra ter peças. E ninguém aplaude esse sentimental embaraço? Faço dos meus veios, fios de ligadura entre a Lua e os demais espaços, deixo meu lirismo barato solto e permito que minhas inquietações me tomem pelos braços. Se não há gosto pelas minhas entranhas, eu sinto muito, limpo-as todos os dias, retiro delas as feridas e desminto todos os iletrados sentimentos. Mas me desculpe, vez ou outra ou vez em sempre (sejamos honestos por um nano segundo) as minhas fossas emergem e petrificam todas as estações do ano numa única estátua. E nesse momento chovem pequenas pedras que martelam os detalhados, denigrem as calçadas e rasgam guarda-chuvas estampadas e sempre perfuram algumas cabeças sensíveis. Tenho prazer na desgraça de ser só. Tenho deleite em cuspir pedras no assoalho sem riscas.

Que raio de mundo é esse que me permite?

Ponho novas flores no meu túmulo e saio pra trabalhar. Ou pra fingir me matar. As memórias deveriam ser descartadas junto com os dejetos no banheiro. Belas flores. Privada florida descendo estampada numa descarga última de silêncio raivoso...
Jogando gavetas quebradas do vigésimo quarto andar

Uma vontade imóvel. Parece contraditório quando dito assim, mas essa é a melhor definição quando nada se move do lugar, quando todas as paredes e janelas se quebram e se reinventam e só a cama em que se dorme permanece quente e embolorada. Quando só as marcas do seu rosto no travesseiro permanecem intocadas. Parece um grande queixume, mas tem mais a ver com uma vontade, assim enorme mesmo de dar um tiro no meio das orelhas e ficar ali vendo o sangue escorrer até melecar todo o tênis. Parece sinistro eu sei, dizer as coisas desse modo tão exagerado, mas é como a saliva destila os pensamentos em palavras impronunciadas. É como a pistola cadencia os disparos. Meus pensamentos se organizam assim trágicos, buscando uma platéia para toda essa carcaça. Hoje alguém vai embora, alguém apagou todas as marcas da sua vida e deixou a casca no lixo. Hoje alguém pretende entrar num ônibus e conhecer um novo lugar, talvez ler novos livros e talvez reconhecer velhos amigos. Hoje alguém está se mudando. Mas eu, eu não posso mudar, eu fico aqui no meu molde, você sabe,reconhece a canção? Eu não posso mudar, eu fico aqui no meu molde, porque eu não posso mudar meu molde, então eu fico esperando o fim do mundo chegar com toda aquela pompa que só o apocalipse cristão desenha. Eu fico esperando como um desfile de carnaval. Espero a morte do Bergman aparecer e contar uma piada, uma aposta talvez com a morte do Lang. E eu entrei nessa onda de descrever todas as mortes que conheço e aquelas que imagino, que já vi, que coloquei replay no vídeo.

E no meio de toda essa coisa desordenada que são as palavras eu me perdi de novo, pardon, mon ami, eu me perdi novamente e fiz um catálogo barato de coisas não minhas. Emoções enoveladas, rancores incorpóreos e despropositados contra as capas de revista, como pode..nenhuma delas fala sobre o fim do mundo. Mas não, é claro que não falam, o mundo só está em ruínas aqui nesse casebre sórdido que eu chamo de alma. É eu nasci no tempo e no lugar errado, deviam ter-me parido da Alemanha em meio ao caos expressionista, lá seria feliz (?) com meu ultra romantismo descabido e meu senso de terror. Com as minhas máscaras e minhas alucinações, teria talvez a alcunha de grande dentro de minhas dores tão contorcidas. Ah, essas minhas tripas que não se reconhecem tem tanto tempo, ficam perdidas filosofando a respeito do império dos sentidos e dos sonhos e esquecem de trabalhar. Sonâmbula percorro avenidas sem placa buscando alguma coisa que já me acostumei a não ter. Um punhado de nada e uma inquietação. Um artista é sempre um inquieto, mas e quando você não é um artista? E olha pro seu RG e decora o número do CPF sem motivo, porque aquelas coisas não te dizem respeito. Declaração de imposto de renda, casa, carro, camiseta da banda X, cortar o cabelo, comer bem, toda essa coisa não te diz respeito. Se faz, bom. Senão, as favas. Devia mesmo ter me retorcido num outro molde. Esse aqui não bate com o tempo. É meio indireto, as vezes obsceno, as vezes cavalheiro, noutras dama. Mas sempre um vagabundo, sempre um alheio. Não importa quanto tempo passe, você acha que faz parte de uma matilha humana, mas quando se dá conta não faz muita diferença se você veio com um brilho nos olhos ou com as tripas nas mãos. Você apenas preenche um espaço, como uma coluna de viaduto. Se não for você, será outro sonhador mais burro. Mas novamente me desculpe meu amigo, eu ia apenas te perguntar a hora... Eu ia apenas lançar um pergunta comum, pra que você diabos foi me perguntar se estava tudo bem?