sábado, 6 de junho de 2009

Por alguns segundos exumando corpos

Ah, eu xingo, deixo a mente vadiar,monto funerais pra minha memória, mas no fundo é tudo história. É modelo de carta em editor de texto. Padrão de tristeza pra comover passante desavisado. Sempre a linha contada com resquícios de dor, palavras apropriadas no gosto grosso da saliva. Mas que na verdade nada querem dizer, além de olhem pra nós! Monto o personagem de acordo com a marca, a gíria, a estampa. Com a marca de nascença, de etiqueta e de espírito. Espírito de porco mesmo na arte de me mentir.
Ponho pistas pros olhos inchados, envergo lágrimas quando não há rosto. Acostumei-me ao espetáculo frio e tosco do vitimismo. Ponham facas e pregos que eu ponho o riso. É bem nesse naipe a conversa. Mas e sempre mas, eu xingo, pra não perder o realismo da cena. Mas que pena. Ninguém viu essa linda atuação. Então pau no cú de todo mundo meu irmão. O palco ali encerado, cadeiras estofadas e confortáveis e nenhum único aplauso? Que tipo de platéia não sádica é essa? Que não curte um sangue falso correndo pelo chão e nem um pouco de vinagre no olho? Tanto esforço pra elevar minha tristeza ao nível máximo e nenhum único " Bravo"?
Eu me minto tão bem que esqueci como eu era, deixei de ter rostos, pra ter peças. E ninguém aplaude esse sentimental embaraço? Faço dos meus veios, fios de ligadura entre a Lua e os demais espaços, deixo meu lirismo barato solto e permito que minhas inquietações me tomem pelos braços. Se não há gosto pelas minhas entranhas, eu sinto muito, limpo-as todos os dias, retiro delas as feridas e desminto todos os iletrados sentimentos. Mas me desculpe, vez ou outra ou vez em sempre (sejamos honestos por um nano segundo) as minhas fossas emergem e petrificam todas as estações do ano numa única estátua. E nesse momento chovem pequenas pedras que martelam os detalhados, denigrem as calçadas e rasgam guarda-chuvas estampadas e sempre perfuram algumas cabeças sensíveis. Tenho prazer na desgraça de ser só. Tenho deleite em cuspir pedras no assoalho sem riscas.

Que raio de mundo é esse que me permite?

Ponho novas flores no meu túmulo e saio pra trabalhar. Ou pra fingir me matar. As memórias deveriam ser descartadas junto com os dejetos no banheiro. Belas flores. Privada florida descendo estampada numa descarga última de silêncio raivoso...

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