sábado, 6 de junho de 2009

Jogando gavetas quebradas do vigésimo quarto andar

Uma vontade imóvel. Parece contraditório quando dito assim, mas essa é a melhor definição quando nada se move do lugar, quando todas as paredes e janelas se quebram e se reinventam e só a cama em que se dorme permanece quente e embolorada. Quando só as marcas do seu rosto no travesseiro permanecem intocadas. Parece um grande queixume, mas tem mais a ver com uma vontade, assim enorme mesmo de dar um tiro no meio das orelhas e ficar ali vendo o sangue escorrer até melecar todo o tênis. Parece sinistro eu sei, dizer as coisas desse modo tão exagerado, mas é como a saliva destila os pensamentos em palavras impronunciadas. É como a pistola cadencia os disparos. Meus pensamentos se organizam assim trágicos, buscando uma platéia para toda essa carcaça. Hoje alguém vai embora, alguém apagou todas as marcas da sua vida e deixou a casca no lixo. Hoje alguém pretende entrar num ônibus e conhecer um novo lugar, talvez ler novos livros e talvez reconhecer velhos amigos. Hoje alguém está se mudando. Mas eu, eu não posso mudar, eu fico aqui no meu molde, você sabe,reconhece a canção? Eu não posso mudar, eu fico aqui no meu molde, porque eu não posso mudar meu molde, então eu fico esperando o fim do mundo chegar com toda aquela pompa que só o apocalipse cristão desenha. Eu fico esperando como um desfile de carnaval. Espero a morte do Bergman aparecer e contar uma piada, uma aposta talvez com a morte do Lang. E eu entrei nessa onda de descrever todas as mortes que conheço e aquelas que imagino, que já vi, que coloquei replay no vídeo.

E no meio de toda essa coisa desordenada que são as palavras eu me perdi de novo, pardon, mon ami, eu me perdi novamente e fiz um catálogo barato de coisas não minhas. Emoções enoveladas, rancores incorpóreos e despropositados contra as capas de revista, como pode..nenhuma delas fala sobre o fim do mundo. Mas não, é claro que não falam, o mundo só está em ruínas aqui nesse casebre sórdido que eu chamo de alma. É eu nasci no tempo e no lugar errado, deviam ter-me parido da Alemanha em meio ao caos expressionista, lá seria feliz (?) com meu ultra romantismo descabido e meu senso de terror. Com as minhas máscaras e minhas alucinações, teria talvez a alcunha de grande dentro de minhas dores tão contorcidas. Ah, essas minhas tripas que não se reconhecem tem tanto tempo, ficam perdidas filosofando a respeito do império dos sentidos e dos sonhos e esquecem de trabalhar. Sonâmbula percorro avenidas sem placa buscando alguma coisa que já me acostumei a não ter. Um punhado de nada e uma inquietação. Um artista é sempre um inquieto, mas e quando você não é um artista? E olha pro seu RG e decora o número do CPF sem motivo, porque aquelas coisas não te dizem respeito. Declaração de imposto de renda, casa, carro, camiseta da banda X, cortar o cabelo, comer bem, toda essa coisa não te diz respeito. Se faz, bom. Senão, as favas. Devia mesmo ter me retorcido num outro molde. Esse aqui não bate com o tempo. É meio indireto, as vezes obsceno, as vezes cavalheiro, noutras dama. Mas sempre um vagabundo, sempre um alheio. Não importa quanto tempo passe, você acha que faz parte de uma matilha humana, mas quando se dá conta não faz muita diferença se você veio com um brilho nos olhos ou com as tripas nas mãos. Você apenas preenche um espaço, como uma coluna de viaduto. Se não for você, será outro sonhador mais burro. Mas novamente me desculpe meu amigo, eu ia apenas te perguntar a hora... Eu ia apenas lançar um pergunta comum, pra que você diabos foi me perguntar se estava tudo bem?

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