quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Crônicas de uma mente vazia Vol. 2

Que diferença faz se não há uma história para contar? Se não há um roteiro e cenas bem dispostas, há apenas fragmentos flutuantes num oceano de aparências. Que diferença faz se você não fecha a porta? Se eu não pulo da janela? Essa palavra ou aquela? A tarde está escaldante e ainda não há nada que preencha de vontade o copo a minha frente. Este último copo trazia tantas expectativas. Trazia tanto desde a sua chegada, mas vejo-o vazio, sem nenhuma mistura que possa medicar. A tarde está quente e o terreno asfaltado parece se retorcer, a espinha da cidade procura refúgio, como dedos mornos numa parede fria. Afastar de si o calor e as expectativas. Que diferença faz se a semana exigiu algo que não recebeu? que diferença faz se o mundo se tornou mínimo e ninguém percebeu? Percevejos sobem nos crânios vazios e nos fêmures detonados pela poeira e pelo descaso, que no fim das contas somam o mesmo item. Rebuscado trabalho de palavras na tentativa de esconder o rosto do sol e da feiúra que naquele habita de forma tão intransigente. Pela sujeira que nele se aglutina formando novos vincos e saliências. Eu não respeito a nova gramática do português. Ainda uso acentos. Ainda preservo a beleza das palavras e luto contra a sua massificação. Guardo na geladeira um pedaço do meu coração, keep cool boy.
As horas pesam, passam incomensuravelmente lerdas, belas e prensadas. Como um dog. A cabeça minha fica entre o purê de batata (abusada de pensamentos ilícitos de amores vítreos de terrores vulcânicos de desejos insanos e de vodkas impuras) e a mostarda. Minha sensação de morte e dor de coluna não poderia ser mais crível. A novela não menos expansiva. Necrose nas pernas, não há para onde correr. Porque a luz do sol cospe sobre tudo sua potência e não há mais cantos escuros nem morcegos nem lentes de aumento. Não há mais cervejas nem desculpas nem sortes. Não há muita coisa que se possa explorar além das alvas folhas de papel que se traduzem em novas solidões. E por mais risonha que fique minha cara pregada numa foto anual quem me absorve cospe de volta o gosto amargo de um fruto acre, roxo morto. Me sinto estupidamente encarcerada. E sinto que ainda haveria beleza se não fosse o pessimismo, e a burrice crônica que toma conta das minhas partes, por descaso, por desuso. Um lado do meu cérebro faleceu de solidão a semana passada. E toda uma parte do meu coração foi esmagada na via Dutra entre fotogramas e largas passadas. Não há mais nenhum pássaro solto no céu. Não há mais nenhuma cor além do azul saarico. Da oferta a preços populares de uma dor que eu já me afeiçoei. Não dá pra entender como tudo isso aconteceu. Aquele copo me trazia tantas esperanças. Aquele copo tinha tudo pra dar certo. Pra ser cheio. Mas ficou trincando num canto que corta a boca e não dá pra remendar. Apensar de tão estar quebrado, ficará inutilizado numa vitrine esverdeada desse bar louco. Que diferença faz pra ele a frincha ou o racho? Acho que nenhuma sorte me convém nesses dias. E ainda assim me fecho mais num cubo duro e escuro de inquietações que futuramente você poderá ver num folheto qualquer ou numa esquina a tecer histórias que nunca foram solidas fora das linhas que o prensaram.

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