terça-feira, 25 de maio de 2010

Pequenas folhas sobre o peito

"Havia um tempo em que eu vivia um sentimento quase infantil. Havia o medo e a timidez todo um lado que você nunca viu..."
tocando no rádio. Ao lado do cinzeiro. Cheio de bitucas. Espaços de tempo esquecidos entre os ponteiros de um relógio imaginário. Havia algo dentro dele que não se movia. Houve por um segundo um espasmo. ( ontem, hoje, pela manhã?) Ela havia visto algo nele. Talvez lido nas suas entrelinhas alguma piada, algum sarcasmo, que no fundo de tudo era menos que uma insegurança, mais que um desejo. Equiparado apenas ao silêncio. Dentro da sua boca fendida por palavras inquietas, por datas e números de telefone, tentou manter a aparente calma. Mas a verdade é que ele estava calmo. O pouco que havia dela em si era bom. Não havia de perder aquela pequena conquista. Tragou mais uma vez. Ou duas. Tomou um gole de conhaque. Suspirou. Abriu a janela sem se mover da poltrona. Porque estava sentado, perto da janela, entre o cinzeiro e o rádio. Deixou a música nostálgica entrar pelos seus ouvidos, incorporar-se na pele. Ficou ali parado. Horas. Minutos. Instantes? Deixou apenas os olhos fechados. Por muitas vezes desejava ser menos que um homem, menos que a mobília que habitava, menos que o cinzeiro e as bitucas, mas sempre seria mais que isso. Pelo simples fato de sentir. Embora, como hoje, se sentisse menos. E nesse sentir, queria ser. Apenas um pedaço de asfalto. Um teco de camisa. Um resto de aguardente. Um pouco de querosene.

Nenhum comentário:

Postar um comentário