Pedaços da manhã numa sacola de plástico
Pareceu um enigma quando ela sorriu. Deixou pra trás um rastro de dúvidas e talvez algum pudor. Deixou para trás toda a cola que tinha no amor, sem sapatos alçando vôo pelas ruas de asfalto frio. Saiu sem jaqueta de aviador, sem poemas, saiu assim como que vai comprar cigarros pra nunca mais voltar. Deixou sobre a mesa as propostas, as idéias a mesa posta com a xícara de café pra caso você chegasse antes de ela resolver voltar. Poderia esperar por ela, assim sentado na mesa tomando café e ouvindo algumas das músicas favoritas que ela havia reservado pra esse momento. E apesar disso não ser premeditado. Em momentos de raiva ela até ensaiou o ato, mas sempre voltava atrás. Não se agüentava no silêncio. Precisava berrar que estava ali.
Saltou a rua de prédio em prédio por cada andar como uma lufada de fumaça parecia atravessar as paredes tamanha a leveza que se apoderava dela a cada passo. A cada metro que se distanciava. Sentia as pernas soltas, maiores do que de nascença. Espichava as mãos para o alto, na certeza de tocar as estrelas escondidas atrás das nuvens, adormecidas ainda naquela manhã sem rosto. Retirava do relógio uma hora por dia, antes roubava dele essa essência. O tempo cada vez mais perdido em relação a ela. E ela se divertindo.
Vestia pedaços de calmaria pra se aninhar. Atravessando paredes como respiro. Pareceu um enigma quando ela sorriu. Parecia até triste quando ela disse “sinto sua falta e odeio isso”. E de certa forma pareceu infantil. Mas era uma despedida. Agora que as horas se afogam e ela não volta da padaria. Era uma despedida e só você não percebe aquele jeito meio idiota dela de te dizer adeus.
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