sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Quando alguns poemas foram jogados do alto da escada e quebraram as pernas

Dificilmente dou nome aos bois, mas hoje acordei com um caco de vidro enfiado na goela, rasgando e sangrando, cuspi tudo que havia aqui guardado e pra minha surpresa não havia nada, além do cansaço. As minhas tripas não saíram do avesso. E eu fiquei escutando “Listen to your heart”. Quando o caco cortou mais fundo e as minhas cordas vocais ficaram nulas inventei uma desculpa pra toda o silêncio. Inventei desculpas pra não reler as antigas. Fiquei vazia. A cama toda sangrada e o peito calmo, mas as minhas linhas, as minhas linhas vibravam, os dedos convulsivos procuraram qualquer pedaço de papel, de parede que pudesse oferecer algum conforto. Mas nada, absolutamente nada, parece me preencher. Quantas vezes terei que dizer que aqui dentro é difícil? Que não adianta me guiar com toda a calma do mundo, que não adianta esperar alguma reação normal de mim. Quantas vezes eu já pintei esse quadro tentando explicar o funcionamento dessa máquina? Não existe um manual. Aperte esse botão para a ação X. Puxe a alavanca em caso de incêndio. Isso não existe. Não há espaço pra frieza, pra indiferença nas minhas linhas, eu não sei lidar com isso. Os meus braços estão sempre abertos por mais que se cortem, se quebrem, inchem ou tenham que ser amputados. A verdade é que eu me lixo pro medo de morrer, seja de amor seja de angústia ou de qualquer outro jeito. Somos seres efêmeros, passageiros num trem desgovernado que pode descarrilar a qualquer momento. Temos corações sensíveis que podem criar espinhos, que podem virar pensão de mendigos. Que podem ficar vazios. Caralho. Eu não sei ser concreto, sou de vidro, transparente. Negligente até mesmo. Porque não ligo se a ação será ridícula, se os poemas irão pra lixeira. Eu preciso de um depósito pras minhas besteiras, de furor, de fogo e fúria. Não sei entender receios, medos ou apostas. Principalmente porque eu sequei suas lágrimas inúmeras vezes. Estive sempre ao seu lado, com a garganta sufocada, mas sempre ao seu lado. E pra que? Pra você jogar todas as minhas esperanças numa lata de lixo em meio a camisas, fetos, jornais e restos do jantar de ontem. Melhor do que ninguém você devia saber da minha sensibilidade oculta, não pra palavras, porque eu te conheço e sei o que há por trás de cada uma delas, mas das suas malditas ações. Não quero uma placa de propriedade particular na sua testa. Não quer ter direitos sobre você. Mas imaginei que ao menos você soubesse lidar comigo e olha que coisa, não, você não sabe. Nunca tentou apreender. Eu tentei me adaptar ao seu jeito frio de fazer as coisas, ao seu modo delicado de ignorar qualquer drama. Mas eu gosto de Almodóvar. Preciso sentir que há algo vivo. E pra variar temos maneiras bem distintas de fazer isso. E ontem eu joguei tudo fora. Porque eu me cansei, há quase quatro anos de indas, vindas, quases, reviravoltas e discussões. Sei que a maior parte da idiotice é minha, porque eu cismo em tentar. Por que as vezes dá certo, por alguns minutos, mas é sempre um jogo frágil. E esse cansaço vem me consumindo. A última chama que havia dentro de mim apagou. Ficaram cinzas e escombros. E uma tagarelice barata, vontade de exorcizar todas as palavras que ainda querem dar voltas dentro da boca. Coisas que você nunca mais vai ouvir de mim. Dentro de mim não fica raiva, apenas uma magoa por você nunca ter tentado de fato. Sempre ter permanecido nas minhas bordas.

E como tudo uma hora descansa e morre esse texto uma hora vai perder a importância. Porque todas as palavras já estão mortas ao saírem da boca ou da ponta dos dedos. Pertencem a um passado frágil, numa via única.

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