terça-feira, 7 de abril de 2009

Poema ou texto ou prosa ou roteiro para uma vida breve

Quando o tempo escorre tenro entre os dedos melecados de açúcar.
Quando o tempo escorre eletrificado entre as cordas vocais, na antena do disparo.
Quando o tempo escorre, espasmo, no corpo do acaso.
Quando o tempo escorre agourento na asa dos corvos silenciados.
Quando as palavras erguem-se de suas tumbas e se pronunciam no espasmo
Quando ela passa evitando a curva do abraço

Distante

De qualquer desculpa, ao largo
Quando ele não se importa
E detrás da porta envia um olho na busca de uma resposta
Quando o tempo escorre vistoso no brilho de um recorte da Lua
Quando Maya exige um pagamento e nada de cheques
Quando o tempo escorre vivo na pele da noite
E o pensamento voa exigente
Numa luz que se interpõe
Ao grito
Da pistola

E aquilo seria sua última noite de tristeza isso ele tinha certeza, como um poema que tem fim quando a caneta retira de si a gota derradeira de tinta e larga a fibra indefesa do papel. Aquela era a sua última noite no mês de insistência, e não , não era uma promessa, era um fato, porque as dez da manhã não sentiu dor. As três da tarde não sentiu dor. E as onze da noite não sentiu dor. Nem o vazio. Pela janela viu o cachorro passar pela calçada e escreveu sua sinopse nessa vida curta. Nesse curta-metragem sem produção definida. Redefiniu o olho, o cachorro, não o homem, e encontrou na Lua o espetáculo perfeito. Ambos, homem e cachorro, ergueram os olhos praquela circunferência distante e se sentiram brevemente reconfortados. Havia algo de mágico que não podia ser explicado, que até podia, mas ao fazer isso morreria no desencanto das ciências exatas. Algumas coisas são como poemas possuem sua graça no inexprimível por palavras.

Quando o cachorro mancou sobre um saco de lixo o tempo escorreu
Quando o homem desceu da sua descrença o tempo se moveu
Quando a Lua tornou-se personagem o tempo revelou
Que todas as coisas pertencem a poemas maiores
e
Distantes
E por natureza
Sem ponto final
Sem o respingo amargo da caneta

2 comentários:

  1. pardon...a diagramação não era bem essa...

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  2. AH, boquiaberta! Que ótima, intenso, belo e sensível como a autora.

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