terça-feira, 20 de outubro de 2009

Corpo presente
(Carlinhos, um fode corpos)

Deus. Deus. Deus. Eu estou tão perdido. Que até invoco seu nome na boca do meu estorvo. Estou tão rouco e tão farto que me deito com diabos. E nem lembro o nome das vitimas. Deus. Porra. Me de uma dedada no olho. Me desperte. Me faça pagar mais por uma noite de insônia. Seja grotesco comigo que de gentilezas já estou farto. Me dê uma reza obscena pra lembrar a crucificação. E eu fico de pau duro com a crucificação. Me dê! Me dê! A droga de uma saída para a minha pornografia diluída.

Eu suo. Abaixo das minhas pálpebras um ardor como se uma queimadura reinasse ali. E eu já não pudesse ver com certeza todos os músculos do sol. É dia. É dia? Uma luz que não me recordo invade meus poros e por apenas um instante me sinto puro. Me sinto até salvo. Mas uma batida na porta deixa meu corpo tenso. Apenas um corpo, mais um corpo na minha pilha. Incinero desejos como se fossem pedaços de papel gastos, rabiscados. Ouço suas histórias, comento seus sussurros. Invento amenidades para tapar buracos e sinto os carrascos saírem das gavetas em risos e choros convulsos. Sinto a pálpebra queimar e o cigarro na minha boca parece mais denso, mais pesado, concretado. A saliva seca. A pálpebra que arde. Uma porta que se fecha.

E eu me sinto tão farto. Tão rejeitado. Como sombras os corpos se afastam silenciosos. E pela janela posso ver o carro virando na avenida principal. Pra casa? Pro trabalho? A roda cansa em se afastar para um caminho conhecido. E eu ? Onde eu fico? Quem vai me deitar num sono sem sonhos? Quem vai me propor um desencontro com minha alma? Acendo mais um cigarro e deixo que o conhaque amanheça mais uma vez dentro de mim e me dou o direito de quinze minutos de felicidade. A arrumadeira da casa troca os lençóis e me deixa camisas limpas. Silenciosa como um puma ela se esgueira pelos espaços. Nos meus quinze minutos de folga eu queria ter merecido a cretinice de ter me tornado advogado. Uma batida na porta. Ajeito a gola da camisa e apago o cigarro. Olhos vazios para mais um sussurro.

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