quarta-feira, 9 de junho de 2010

Cigarro solto nº 12

Mãos duras tateando no escuro da noite. Conversa fiada e banal. Coisas que se houve no bar. Na cozinha. Na sala de espera do dentista. Poética barata. Mas as mãos estavam tensas, a dureza era de alma e não só de frio. Falava empolado pra esconder a ignorância. Ria demais pra não falar asneiras. Cada hora se sentia mais fantasmagórico. "Que bobagem" diziam ao seu redor. Mas ele se sentia mais aparte de tudo que antes o formava, ou que ele achou que formava. Ao seu redor sentia apenas um grande vazio. Um copo vazio. Um corpo vazio. Ardendo de palavras e pequenos anseios que não sabia responder.
Encostou por acaso a boca na ponta do lábio dela, ficou assim, numa maciez de segundos. Uma máciez roubada. Havia tristeza nos seus olhos e uma certa indignação. O acaso mais uma vez lembrava como era solitário ao seu lado. A sua frente. Às suas costas.
As mãos rijas, estátua contemporânea de um corpo sem frutos. Amores nulos o percorriam como formigas. Dentro das suas calças, camisas, meias, sapatos. Apenas uma coisa mole e folgada balançava dentro de si. Sentia-se solto, mas não liberto. Livro aberto com siglas em todas as páginas.
Deixou um pouco mais a lembrança do abraço sensato, dos braços que pouco a pouco o enlaçaram, sem força, sem manejo, assim arquejando, o peito ficou miúdo. Não era nada demais. Apenas um daqueles momentos em que o corpo fica vidraça e qualquer vento transpassa e racha. Mas ali ficou aninhado, num horizonte macio, sem trejeito. Era vazio ao seu lado. E suas mãos eram frias como gelo.

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