segunda-feira, 14 de junho de 2010

Cigarro solto na boca nº15

Percebe a diferença entre a sua textura e a minha linha. Achei que ambas sorriam no mesmo espaço. Mas diferem em muito quando postas à luz. A tua fica rígida enquanto a minha se desmancha. Ainda fica grossa a sombra que recobre os dias. Mesmo que a boca deseje romper as amarras que lhe prendem, o silêncio emerge como solução. Como um puma que vaga pela área aberta da noite, solitário, entre galhos de Segall, fico incerto sobre como caminhar por esta rua. Que atende pelo seu nome. Pela ausência que desfaz a espera (e que por vezes a refaz mais bruta). Espera de que? Que se espera da noite? A lua não encanta, nem decifra segredos. Não traz à tona os sufocos do peito, tão pouco os montros dos filmes da infância.
Perto da sua letra, a minha é rude. Perto do seu par de avelãs, os meus são névoa. Estranho que pense nisso, apoiado na janela, corpo regelado, na espera de uma resposta. De alguma coisa nova, que irrompa do meio dos prédios e das estrelas, transpasse a carne com a doçura de uma nova paixão e a certeza de um novo invento. No vento fico procurando resquícios dos passos. Em tão pouco tempo todo o tempo ficou errado. E perto ainda das suas mãos, as minhas são serralherias. Meus copos de vodka parecem pobres, o que me preenche parece pouco, serragem. Pra alguns satisfaz, pro seu forro, nem chega a ser estuque. A meu corpo é pintado de cal por fora, ríspido, vulgar, parece baixo. Por dentro, cheio de gavetas, de letreiros, de desenhos...de pequenos labirintos, portas. Já não sei. O que me aflige é a certeza de ter dado um tiro no pé. Um tiro no ar e acertado um pássaro indefeso. Ter singrado o horizonte de pólvora sem necessidade.
Trago a camisa aberta.. deixo no peito um pouco de vento, na boca ainda aceso o álcool e a nicotina. Os dedos amarelecidos e ainda um pouco esbranquiçados. Talvez se eu escrever até o cansaço chegar eu pare de pedir desculpas por existir. Ao fundo a chaleira explode em fumaça...o café talvez me traga a lucidez, ou ao menos a calmaria necessária pra viver dentro de mim.

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