terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Um estranho à espera de um milagre

O pobre imbecil esperou envolto em lágrimas até o último segundo daquele dia fatídico. Onze e meia. Onze e trinta e oito. Onze e quarenta e sete. Nada. nenhuma palavra. Nenhum movimento. Aquele pobre diabo esperava a coisa mais simples e tosca do mundo: um telefonema. Um telefonema de aniversário. Nada mais do que isso. Esperava ansioso que ela lhe justificasse a demora, remoia as desculpas que ela nunca lhe daria, porque o telefone não iria tocar. Ela o havia esquecido completamente. E essa certeza inundava seu rosto em ondas cheias de rictos. Qualquer sinal, qualquer palavra dela bastaria. Não pedia mais que isso, como um bom cachorro, contentava-se com menos que migalhas. E vendo a impossibilidade de receber ao menos isso, seu peito uivava dolorido. Queria correr, queria ir até sua casa e perguntar porque. Mas ele melhor que qualquer outro sabia o porque. Sabia todas as respostas, por isso mesmo era um imbecil. Deixava seu sentimental dominar todas as fibras do seu corpo. Era menos que um indigente. Não havia quem lembrasse dele como individuo. Senão por um acaso. Senão por um descuido. Os cento e noventa e três números da sua agenda telefônica de nada serviam, porque ele podia contar nos dedos as pessoas que haviam se lembrado dele, e que curioso, não somam UMA mão. Nem ao menos isso.
As lágrimas escorriam pela seu queixo, pescoço e desembocavam em sua barriga. Ali, formando verdadeiras ondas de tristeza. Onze e cinqüenta e cinco. Corroia-se de dor. Sentia-se pequeno e nulo. Menos que uma formiga no meio da selva. Apenas ali. Por um acaso havia nascido, e nem saberia explicar porque cometeu essa indelicadeza. O pobre imbecil não sabia o motivo de nada, não tinha razão para nada. Não era. E todas essas certezas juntas faziam seu rosto inchar. Vincos abismais se abriam no seu peito. Todas as certezas que julgara até agora existentes caiam por terra. Era a merda de um fraco. Um pedaço de vidro simples debaixo de uma picape. Esmagado. Fragmentado. Inútil. Absurdamente inútil.

Ela havia se esquecido completamente dele. Ele era apenas um estranho e como este, seu lugar era na sarjeta da memória visual, um mero resíduo, um mero acaso. Seus pensamentos iam e voltavam, em correntes de ódio por si mesmo e pelo resto da terra. Queria muito sumir, simplesmente desaparecer, não faria a menor diferença para ela. Para ninguém na verdade. Era tão fraco. Era tão tolo. E isso não fazia diferença para ninguém. Para quem faria diferença saber que ele passou o dia vendo a chuva cair na espera de um abraço? Para quem faria diferença se ele passou os últimos minutos do seu dia em prantos? Sozinho. Largado. Trancado no seu quarto. Inchado. Lacrimoso. Lamurioso. E além de tudo silencioso, contendo a respiração para não acordar as paredes. Os móveis. Os lápis e toda a sorte de objetos inanimados.

Meia noite. E não, não ocorreu como um inesperado e presumível final de filme, em que no último segundo o desejo se realiza e um sorriso se abre, não. O telefone permaneceu ali mudo, inerte. Ela não ligou. Ela o havia esquecido completamente. A sua pequena felicidade de saber-se minimamente importante pra ela desvaneceu-se. Agora ele era um total estranho.

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