quarta-feira, 18 de março de 2009

Cento e cinquenta e cinco pingos de chuva

Felicidade sozinha é um membro do corpo do medo. Ás vezes por ele deixa-se de fazer, falar, mover, mas afinal de que serve podar-se por conta disso ou por conta de outras pessoas? Somos seres sociais e não selvagens, respondeu-me uma pessoa. Mas como ser um ser social pleno se você não estiver realizado consigo mesmo? Não se trata de um bom trabalho, filhos e toda essa resposta simplista, trata-se de saber-se inteiro. Pensar-se poema e enredo, e não estrutura e desejo. Ser sozinho às vezes é mais difícil e ás vezes é fuga fácil. Varia. Depende que tipo de personagem a gente escolhe no armário. Pode-se variar como num teatro. Fazendo um filme debaixo da chuva que cai numa porrada sem igual. Mohammed Ali espancando telhados.

Isso parece tão óbvio, mas tantas e tantas pessoas escondem-se atrás de espelhos, palavras e outras máscaras e desculpas gastas para não existirem. Deixam que seus rostos se desgastem enferrujados dentro de uma gaveta. Suas pistolas nunca dispararam um único tiro e seus dedos nunca sofreram um arranhão. É como ler uma palavra no dicionário por não ter o que fazer, o sentido dela está lá, mas nunca se sabe o que fazer com ele.

E ela passou pela porta, olhou a chuva caindo e deparou-se com pequenas cascatas geladas dependuradas nas calhas, barcos de papel ondulavam nas valetas. Era uma noite fria de chuva e não havia muito o que fazer. Pessoas corriam em desespero, protegendo suas bolsas, papeis, cortes de cabelo. Deixou o guarda-chuva dentro da bolsa e andou pelas ruas. Num balé de guarda-chuvas ficou nua. Deixou que tudo escorresse sobre sua face.

Sentido. Guarda-chuva. Feiura. Medo. São só palavras. E dentro delas não há um abrigo real, apenas uma espera momentânea que se esvaí no primeiro assobio da chuva.

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