terça-feira, 17 de março de 2009

Sinfonia de acertos

Ouvia as canções com ouvido nomeado. Cada letra fazia sentido dentro de seu estado. E mesmo que numa delas soltasse amarras de um corpo logo se revia atado. Dependurado sobre a sua pele como uma camada de sol. Em silêncio gozando dos pequenos deleites que sua imaginação lhe oferecia, sentindo com calma cada pedaço da calçada. Seguindo uma trilha de nacos de emoção. Ali, não mais afoito, na aparência dominado, por dentro caótico e enramalhado de flores diversas. Rosas, gardênias, cravos, margaridas e girassóis. Ouvia as canções enquanto o tempo passava e tanto mais se adiava o reencontro, mais se agigantava sua pressa em fazer-se mais tranqüilo. Transformando em belos recomeços os imprevistos. Nada estava definitivamente perdido. E afinal de contas o que era o definitivo? Essas coisas dependem de suas inter-relações com outros objetos, sentimentos e navalhas de tempo. Nada é definitivo fora de um espaço delimitado. Apenas no fecho da mão a morte é definitiva para uma semente, se jogada a terra, continua seu curso natural. A diferença é que a natureza humana é cheia de percalços, de lombadas. E de nossas tristezas armamos reais dramas e pequenas comédias em tentativas parcas de esconder ou sobressair. Nada mais antinatural e nada mais comum.
Ouvia as canções e preenchia-se de sol na tarde sem interlocutores. Há muito regia sozinho sua sinfonia de acertos. E esta era longa, cheia de erros e pequenas incertezas. Mas com calma, regia pedaço à pedaço. Em si havia uma esperança e um amor, amor no sentido de querer do mundo, pelas pequenas coisas que respondiam ao chamado do seu nome e que por breves espaços de tempo o possuíam e se deixam possuir. Os laços que carregava eram muitos, e por vezes os esquecia. Alguns já se haviam desatado devido ao desleixo, outros resistentes aprendiam o tempo e o modo de seu “dono”. Assim povoado de pequenos carinhos, não se via incerto em relação à seus propósitos. Ouvia as canções, e embora tivesse o ouvido nomeado, sabia que haviam outros tantos nomes ali encaixados.

Nenhum comentário:

Postar um comentário