terça-feira, 1 de setembro de 2009

Palhaços sazonais - quando o espetáculo se torna um saco

“Je me sens seul
Très seul
Je me sens comme le petit prince
mas
Je n’ai pas une rose pour parler avec moi...”

E ele entrou num carrinho apertado e minúsculo e fez farra com outro palhaço. Sua roupa balançava e deixava pender cores por todos os lados. O sorriso pintado de orelha a orelha.

“Sinto-me extremamente só quando a noite bate e não há ninguém para dividir aquele conhaque comigo. Ninguém para me ouvir reclamar de dores no pé ou da falta de algo. Ninguém para pousar os olhos com calma, ninguém para apenas ouvir dentro de um silêncio guardado. E quando essa melancolia me invade resolvo dar um passo contra o meu ego e falar com você. Apenas mais uma dose da sua infinita consciência do mundo real. E quando eu resolvo dar um passo pra trás você me bate na cara usando uma tábua de cadernos com a minha própria caligrafia. Virou marasmo. Virou jogo farejado. Você sabe o início da peça e onde entram os intervalos.”

Saiu silencioso do palco. Atrás de si a carcaça de um espetáculo encenado até a exaustão. As luzes já rarefeitas, tão cansadas do mesmo espaço. Os aplausos surgiram apenas em placas escritas pelo contra-regras. Sentiu a maquiagem borrada e pesada. Deixou o palco meio arrastado. Quando a temporada teria fim? Aquele personagem já havia lhe sugado toda a energia e toda a característica.

“Eu rio mas não sei o motivo, fico indo e vindo sem força de quebrar pedras e abismos no caminho, removo a areia de suas casas, as conchas e as pequenas palavras. Mas dentro de mim tudo continua revolto, envolto em pequenos alvéolos de cimento. Pesa. Pesa. Pesa muito.”

Saiu para a rua revisitado por velhos ventos que sempre tinham o mesmo cheiro. Conhaque, ranço e bolor. Quando aquela temporada iria acabar e o circo mudar de lugar? Era a pergunta que não saia da sua cabeça enquanto descia a rua de volta pra casa.

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